Total de visualizações de página

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Ataque às pragas

Pesquisadores dos EUA e do México modificam a toxina Bt, amplamente usada em lavouras de todo o mundo, e a tornam mais eficaz no combate aos bichos que afetam as plantações
» Thais de Luna

A mariposa Plutella xylostella, que se tornou resistente à toxina Bt (Alex Yelich/Divulgação)
A mariposa Plutella xylostella, que se tornou resistente à toxina Bt

Insetos, ácaros e fungos são alguns dos pesadelos de agricultores em todo o mundo. Considerados pragas, esses seres atacam as lavouras e, segundo estimativas, destroem cerca de 30% das plantações apenas no Brasil. Para contornar essa situação, produtores rurais recorrem ao uso de inseticidas, entre eles a toxina da bactéria Bacillus thuringiensis (Bt), usada há pelo menos 15 anos em nações que autorizam a produção agrícola de transgênicos. O problema é que, quanto mais se usa um composto tóxico, maior é a probabilidade de as pragas se adaptarem a ele. De olho nessa questão, um estudo publicado recentemente na revista Nature Biotechnology, realizado por pesquisadores da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, e da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam), revelou que uma pequena modificação na estrutura da toxina Bt a torna eficiente para combater mesmo os insetos que sofreram mutações genéticas e ficaram resistentes à versão natural do composto.

A toxina Bt é amplamente utilizada, especialmente no cultivo de milho, algodão e batata. Dados mostram que, apenas no ano passado, o composto foi usado, em forma de spray ou na alteração genética de vegetais, em mais de 140 milhões de acres de plantação no planeta. A Bt tem ação muito específica, pois só mata os seres que possuem uma enzima chamada receptor de caderina em seu intestino. Quando a toxina é ingerida por insetos que contêm esse receptor, ela é quebrada e entra nas células da parede intestinal do animal. Em seguida, causa a destruição das células e a consequente morte da praga.

Um dos autores da pesquisa, Mario Soberón, especialista em biologia molecular e professor da Unam, diz ao Correio que alguns insetos — como a mariposa Plutella xylostella e determinadas espécies de besouros e lagartas, entre outros — criaram um mecanismo de resistência ao composto, ao sofrerem mutações genéticas no receptor de caderina. “Nós, então, modificamos a estrutura da toxina para ela ser absorvida diretamente pelas células dos animais cuja enzima sofreu mutação. Assim, a Bt não ia precisar do receptor de caderina em sua forma intacta para matar as pragas”, descreve.

O líder do estudo, o professor de entomologia da Universidade do Arizona Bruce Tabshnik, afirma à reportagem que, inicialmente, ele e sua equipe acreditavam que a versão modificada da toxina Bt seria eficiente apenas contra insetos cuja resistência ao composto tinha como base a mutação genética na enzima presente no intestino. “Esse receptor é o que se liga à toxina Bt original nos insetos suscetíveis a ela”, explica. Testes em laboratório com as pragas, porém, revelaram que a atuação do composto é ainda mais ampla. “Surpreendentemente, a toxina modificada foi eficaz contra alguns insetos cuja resistência não era causada pela modificação na caderina, além de nem sempre ter combatido as pragas que têm o receptor alterado”, comenta o norte-americano.

O doutor em microbiologia e entomologia agrícola Ítalo Delalibera Júnior, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (USP), acha interessante que a pesquisa tenha conseguido contrariar a hipótese difundida na comunidade científica de que a toxina Bt modificada geneticamente só seria eficaz contra insetos que fossem resistentes à toxina original. “Os compostos que tiveram a estrutura modificada pelos autores foram muito mais potentes (até 350 vezes) do que os originais contra as populações de insetos resistentes, independentemente da presença ou ausência de mutações nas enzimas do intestino.”

Vantagens

Tabshnik ressalta a importância dessa pesquisa para a comunidade científica: “Com a análise, podemos entender melhor como a toxina mata insetos e como eles se tornam resistentes a ela”. Já para a sociedade, a relevância do estudo está no uso potencial de toxinas modificadas para fazer, de maneira ecologicamente sustentável, o controle de pragas.

Alejandra Bravo, coautora da pesquisa e professora de biologia molecular da Unam, destaca que plantações transgênicas mais resistentes a insetos têm sido úteis na diminuição do uso de inseticidas químicos e, em alguns casos, no aumento do rendimento dos produtos cultivados. “Portanto, nossa versão modificada da toxina Bt poderia ser uma ferramenta valiosa para combater a presença desses animais no campo, o que pode resultar no uso prolongado dessa importante tecnologia”, diz. A empresa de biotecnologia dos Estados Unidos Pioneer analisa atualmente o potencial de comercialização da toxina Bt alterada.

O entomologista norte-americano adverte que os animais sempre vão se adaptar a táticas de controle. Tabshnik conta que o próximo passo da pesquisa é determinar se a forma modificada da proteína tóxica a pragas é eficiente no campo, já que os testes foram feitos apenas em laboratório

Correio Braziliense. Brasília-DF,  18 de outubro de 2010 

Nenhum comentário:

Postar um comentário