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quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Vacina com excesso de proteína matou cães

São Paulo, terça-feira, 04 de outubro de 2011



Análise da injeção antirrábica aplicada em 2010 apontou falha como possível causa de reações fatais em animais

Vacinação do governo deverá ser feita com medicação produzida por outro laboratório até o final deste ano

SÍLVIA CORRÊA
COLUNISTA DA FOLHA

A vacina antirrábica distribuída pelo Ministério da Saúde para a campanha de imunização de cães e gatos de 2010 tinha excesso de proteínas bovinas. É essa a conclusão da análise feita pela Universidade de São Paulo e obtida pela Folha.
A principal hipótese dos pesquisadores é que, em concentrações elevadas, essas proteínas tenham desencadeado reações alérgicas extremas em alguns animais, levando parte deles à morte.
Com base nessa constatação, o Ministério da Saúde exigiu alterações na fabricação da vacina para aceitá-la na campanha deste ano. O ministério reconhece que 283 reações graves podem ser relacionadas à vacina -210 mortes de cães e gatos.
Na ocasião das mortes, no entanto, só o governo de São Paulo anunciou o registro de 2.627 casos de reação. As reações levaram o governo a suspender a campanha e atrasá-la neste ano. Feita geralmente em agosto, ela ainda não aconteceu na maioria dos Estados.
Em 2010, a vacina foi feita pelo laboratório Biovet. Neste ano, as doses serão produzidas pelo Tecpar (Instituto Tecnológico do Paraná).
Até 2009, o Ministério da Saúde distribuía doses da vacina fabricadas por meio de método diferente do utilizado no ano passado.
A USP analisou as doses da vacina a pedido da comissão permanente de raiva de São Paulo. "Sabíamos que outros países haviam tido problemas com o excesso de proteínas bovinas [EUA em 2005 e Japão em 2006]. Por isso, decidimos mensurá-las", diz o veterinário Marco Antonio Stephano, responsável pelo Laboratório de Imunobiológicos e Biofármacos do Departamento de Tecnologia Bioquímico-Farmacêutica da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP.

CONCENTRAÇÃO
Obtidas do soro do animal, essas proteínas servem para alimentar a cultura de células na qual o vírus da raiva deve se multiplicar. Após a multiplicação, a mistura tem de ser muito bem purificada -o que não aconteceu, segundo as análises. Nas vacinas disponíveis no mercado, a concentração de proteínas bovinas é de cerca de 0,25 mg/ml. Na antirrábica usada em 2010 estava em 1 mg/ml.
Os cães tiveram vômito, diarreia sanguinolenta, dificuldade respiratória e hemorragia gastrointestinal. Os gatos, alterações respiratórias que levaram à apatia e à inanição. São quadros compatíveis com choque anafilático.
"Reações adversas sempre existirão, mas nossa expectativa é que os índices voltem aos níveis históricos", diz Stephano. Em São Paulo, em 2010, foram registradas 4,19 reações adversas para cada mil vacinados, índice muito acima de anos anteriores (0,06 animal por mil).

CAMPANHAVACINAÇÃO PODE VOLTAR EM DEZEMBRO

O Ministério da Saúde quer entregar a vacina antirrábica em tempo de os Estados fazerem suas campanhas até dezembro. Desde 2008, o país teve cinco casos em humanos -quatro no Maranhão e um no Ceará. Na falta de vacina gratuita, donos de animais pagam até R$ 40 pela imunização em clínicas particulares.

OUTRO LADO
Produção segue legislação, diz o laboratório


DA COLUNISTA DA FOLHA

O laboratório Biovet disse à Folha que agora apenas o Tecpar (Instituto Tecnológico do Paraná) fala sobre as reações adversas causadas pelas vacinas. O Tecpar assumiu a produção da vacina que será usada neste ano.
O diretor-presidente do Tecpar, Júlio Félix, diz que a produção teve de incluir um sistema adicional de filtragem e que a nova vacina a ser distribuída teve de ser testada em cães e gatos imunizados em 2010 para se observar se não teriam reações.
"Apesar de termos concordado com as modificações, é preciso ressaltar que o produto fornecido no ano passado estava absolutamente dentro do que prevê a legislação", afirma Félix.
Governo e pesquisadores confirmam o que diz a empresa. O problema, dizem, talvez esteja na lei. As vacinas antirrábicas não precisam ser testadas em cães e gatos antes de irem ao mercado.
No caso do produto com excesso de proteínas bovinas, os testes foram feitos em camundongos e não houve reação alérgica. Mesmo sem previsão legal, testes em cães e gatos foram uma das exigências feitas pelo governo para voltar a comprar a vacina antirrábica dos laboratórios Tecpar/Biovet.


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